domingo, 25 de agosto de 2019

À Fernanda Young

À Fernanda Young (1970 - 2019)

Só ouvi e senti
A dura verdade que nos espera.
Não ela a nós,
Mas nós a ela,
E mal sei do sol e da noite
Cruel e sincera.

Nunca a li, mas agora senti
Aquela desconcertante pergunta
Misteriosa e fria,
"Que mais vale da vida?"
Crise existencial sem sorte
E ela vem repentina, a Morte.

Querida jovem escritora,
Que de nome só conhecia,
- Não me escondo e fraco sou -
Que parte desta parte do mundo,
E mudo estou, sem nada
Senão ao ar o porquê deste dia.

Ao menos sinto e ao sentir
Entrego-me à vida presente
- Ilusão de quem ama e vive -
Porque ainda aqui estou
Nestes versos passageiros.

Jovem e tão cheia de vida
Passada em palavras a limpo.
Jovem no que dói em mim
E nos outros que vêm e vão.
Eu descanso no que não sou,
E o descanso vem, bem, sem, nem, tem.

Jovem e nos versos algo eternamente jovem...

- flavio notaroberto

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Conto

Ontem, as coincidências da vida me fizeram almoçar no Galeto's no Shopping Pátio Paulista acompanhado com uma pessoa tão importante para mim, e, de quebra, outra coincidência, me fez dar uma singela lembrança a ela.

Sempre quis ter este momento com ela e das vezes que tivemos, eu nunca havia ficado satisfeito. Das vezes que saímos, eu nunca gostava do ambiente, porque para mim, ela merecia muito mais. Muito mais mesmo. Fiquei no Almanara, fila de espera de meia hora, e ela por mensagem:

"Logo estou aí."

De repente, ela aparece. Sorrimos e nos beijamos no rosto. Eu agradeci. Resolvemos deixar o Almanara e ir ao Galeto's. Fomos em dois minutos falando amenidades do tipo: vim da faculdade, fui resolver algo no banco etc. Por fim entramos. Ela saboreou uma picanha ao ponto com arroz branco e uma salada. Tomamos dois chopps Heineken. Conversamos muito.

Na entrada, porém, reparei que ela estava de chinelos havaianas. Calça branca porque estuda fisioterapia. Eu nada disse na hora. Me confessou depois que gosta de ir de chinelo para a faculdade. Depois coloca o sapato no trabalho.

Resumindo: estas cenas me tocam. Me tocam tanto que eu falei para ela ao longo da quase uma hora de almoço:

- Eu reparei que você está de chinelo quando entrou e veio almoçar com a maior naturalidade, de quem entrava na areia da praia, somente faltando o mar. Sabe, jamais perca esta humildade, esta doce simplicidade, que você tem. A gente tende a ficar mais orgulhoso quando mais velho, mas não permita.

Eu acho bem isto. O tempo tende a deixar  as pessoas ou mais egoístas ou mais altruístas, ou mais humildes ou mais arrogantes. São as circunstâncias, mas também as escolhas. Por que negar nossas origens com o passar dos anos? Por que anular as memórias que nos forjaram no passado? Por que se perder em um novo mundo que nunca fora nosso? A alma interna jamais pode ser deslocada da sua essência, porque se assim o fizer, a gente se perde numa grande confusão.

Eu preciso dizer que, apesar das complexidas do ser humano, amo tanto esta minha vontade de crer nesta simplicidade de estar feliz internamente. Em paz com os homens. Em paz com a vida. Não estou compartilhando minha paz, estou compartilhando os chinelos de dedo. Na praia ou em qualquer lugar.

(Conto 2015)