Uma das coisas que mais me arrependo foi queimar dezenas de cartas de minha amiga Renata que me enviou entre os anos 1995 e 1997. Talvez chegasse a uma centena. E eu as queimei por causa de minha ex-esposa. Aquilo a incomodava e assim o fiz. Eu entendi como desconforto com o outro. Claro que a decisão foi minha, como sempre. Poderia ter, naquele momento, nem cogitado esta perspectiva. Afinal, eram minhas histórias pessoais com as quais hoje eu estaria feliz tendo estes registros. E neste ponto, quero chegar ao passado porque o que há de mais bonito de nosso passado é o futuro sem arrependimentos.
Ontem tive um impulso de apagar coisas que representam meu passado. Foi quando ocorreu-me meu presente. O tempo tem o poder de acalmar nossos sentimentos confusos que nos arrependemos dos impulsos que tivemos de eliminarmos rastros do que foi importante para nós. Especificamente, as cartas da Renata dariam um belo de livro: tanto as dezenas que eu enviei quanto as que eu recebi.
Os momentos vivem e nos fazem. Os momentos sozinhos, deitados, descansando, vendo filmes, dentro de um ônibus ou carro são interlúdios, são aquelas pausas que ligam nossos momentos importantes de troca com as pessoas. Os objetos e lugares tem este figurativo poder de evocar os momentos compartilhados. Por que evitar os lugares então? E pior: por que desfazer-se dos objetos? Precisaremos deles porque o futuro transforma o passado em experiência e toda experiência é um importante sonho que fica!
Ontem mesmo, eu iria me desfazer de coisas simples que evocam pessoas e momentos. Ai refleti nas cartas da Renata, que tanto me arrependo, mas sem traumas, e percebi que preciso destes momentos passados e seus registros. Quando eu era mais sozinho entre os anos 1993 a 1997, tive tantos registros pessoais! Tudo virou cinzas. Mas tudo bem. Eu tomei a decisão na época para ser mais cauteloso agora. As circunstâncias nos levam a decisões, ainda mais eu que não sei falar não nem para mim mesmo. Não quero me arrepender. Escolho então deixar os registros de todos os momentos, caso seja possível.