quinta-feira, 30 de abril de 2015

Outros tempo

"Fossem outros tempos, provavelmente, mandar-lhe-ia poemas ao invés de cartas. A diferença entre um e outro seria a justificatição do sentimento que o poema e a carta possuem. Acredita-se mais na verdade de um ardente sentimento em versos do que em prosa solta feita esta.

Estou agora em seus olhos. Talvez eles brilhem para mim e estas palavras - que me representam - retribuir-lhe-ão com carinho e ternura o doce luzir, e tentarão elas tornar suave o fel; tentarão restituir ou dar vida ao inanimado; deixar belo o feio; eternizar o efêmero; tornar esbelto o esquálido; comedida a intemperança; próximo o distante."

domingo, 26 de abril de 2015

Amei

Amei. Não amei quem acham que eu havia amado. Amei quem eu ainda amo e gostaria agora aqui ao meu lado. Quem eu amo sente. Sente meu amor. O meu amor agride? Provavelmente não. Edifica? O que os anos, porém, me deram o privilégio de viver minha vida; os mesmos anos me deram a consciência de que não podemos roubar das pessoas o que de mais precioso existe para elas: seus próprios anos.

sábado, 25 de abril de 2015

Nao permita

Não permita-se. Do erro. Erro comum. O erro de ser igual. Ser um dos modelos encaixados no mesmo perfil replicante. Sim, eu sei! É mais fácil, cômodo. Ser igual e reproduzir-se igual. O desafio diminui. Gasta-se menos energia. Equilibrá-se na divisão infinita das partes. Ser comum aproxima os comuns e afasta os incomuns.

Ser igual somente conforta quem se dá bem com o anonimato, ou com a segurança porque desaparece na multidão. A multidão encobre, suga, deixa seu eu numa patética forma acabada de linha de produção. Particularmente, isto sempre me incomodou e me incomoda ainda. Faço-me por fora um comum. Por dentro são estas palavras incomuns que chegam a assustar, surpreender às vezes, causar algum cansaço, provocar dissintonia, mas também acalmar os não comuns.

(...)

O mundo nos tende a tornar comuns. O mundo tem outras opções, porém. A opção existe em ser comum por fora. Por dentro, diferente, autônomo, desigual, tendo prazer com o vinho pelo vinho, do cinema, pelo cinema, dos estudos e leituras, pelos estudos e pelas leituras, das amizades pelas amizades que nos fazem sentir quem somos e não mais um homogeneizado. Ser comum é fazer dos prazeres meios para nos tirar da solidão e da carência. Ser incomum é sentar com a solidão e com a carência, agradecendo pelas pequenas boas coisas que o enriquecem.

Meu espírito sempre foi este. Não sabia dentro de mim isto e somente o tempo encarregou-se de ir lapidando, com muito sofrimento necessário (aquele desacordo entre a alma e a vida externa) e a felicidade, que para mim foi sentir os meus próximos felizes. O erro em querer ser igual à multidão é que "a multidão é um monstro sem rosto e coração". (Racionais).

Exato. Ouço Racionais MC. Não para pertencer à multidão. Tudo que faço é pelo prazer de fazer aquilo. Consigo sentir a verdade do momento e espalhar a essência de minha própria verdade. A minha. Não a da multidão.

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Pe. Fabio Mello

Ouvindo o Pe. Fabio Mello falar, suas sintéticas pregações, traduzindo com tão profundidade e simplicidade o mais óbvio das dores humanas, das angústias, das dúvidas e incertezas, bem como da felicidade possível no ato de amar e na necessidade de se sacrificar, eu tenho vontade íntima de virar padre.

Mas aí vem-me à cabeça que amo as mulheres e jamais olharia para uma delas sem o homem mundando estar presente em mim. Ou seja, meus conflitos seriam vários. Não saberia, a certo momento, quando Deus falaria por mim, quando eu mesmo falaria por mim.

Por isto, ao ouvir o Pe. Fabio Mello, eu o agradeço. Mal sabe ele de minha existência e de minha gratidão. Mal sabe ele que me inspira a vontade de ser padre, porém sem vocação alguma.

Prefiro caminhar como escritor, professor, poeta, comunicador, na simplicidade das dezenas de pessoas que me lêem e me ouvem. De alguma forma, meia dúzia de almas são tocadas.

Eu aguento as críticas com facilidade por este motivo: existem palavras que tem o alvo certo, o coração a ser atingido, e este agradecerá, como eu agradeço os poucos áudios que ouvi e os poucos vídeos que assisti do Pe. Fabio Mello. E em certo sentido, não me sinto só. Há seres humanos que tem algo a dizer e eles vão lá e dizem.

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Pessoas Importantes

Por razões pessoais, das mais íntimas às mais explícitas, ela nos admira mesmo à distância, pelo simples fato de existirmos, sermos, tentarmos algo que valorize em parte a vida e o sacrifício de viver. Temos pessoas que gostam de nós. Muitos tem. Não é privilégio de ninguém a exclusividade tanto do gostar quanto do amar. E este pequeno texto é em particular para a minha prima Esmeralda. Sinto da parte dela aquela torcida pelo meu crescimento, pelo sucesso de meus livros, pela minha paz e minha vontade de estar presente e ser presente.

Sempre alguém (fora as mães) torce por nós.

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Ao seu Lado

- Nossa! Como é bom estar ao seu lado!

- Sim. Eu sei como é bom estar ao meu lado. Ao meu lado, eu sinto a vida, e ao sentir a vida eu compartilho; ao meu lado, eu, a cada momento, agradeço poder estar vivo e assim eu compartilho a graça de agradecer; ao meu lado ser útil é estar presente e a presença preenche vazios, porque gosto da utilidade, gosto do presente, gosto de preencher vazios; ao meu lado a arte tem vida, e a vida morre, e a arte eterniza, fico então a um passo da morte e da eternidade, uma vez que os olhos que nos olham perecerão e a arte sentida continuará; ao meu lado meus olhos brilham o perene da arte; ao meu lado o corpo esquenta o frio, e o frio somente é bom para ser aquecido; ao meu lado o sol, que nos esquenta e faz da vida uma realidade, tem duplamente o sabor da pele bronzeada, da cerveja gelada, da caminhada despretensiosa de mãos dadas; ao meu lado minha mente fica ao mesmo tempo nas necessidades vulgares como "traz papel higiênico", mas também vai aos saltos filosóficos de Kant e aos estudos neurocientíficos de Ramachandran; ao meu lado a literatura tem existência e o "nois vai" corintiano é poesia; ao meu lado o riso tem humor, a tristeza tem seu tempo, a solidão tem sua presença, o amor tem seu sacrifício, a depressão tem sua experiência, as dúvidas tem outras dúvidas, as certezas tem suas dúvidas, os sonhos palavras para tentar descrever nosso breve tempo um ao lado do outro...

- Mas eu apenas afirmei como é bom estar ao seu lado, e não perguntei "por que é bom estar ao seu lado?" Por que tantas palavras? Eu sei disto... Quebrou o lirismo.

- Verdade. Desculpe-me.

- Só me abrace agora e boca fechada.

- Está bem. Quer uma água? Alguma coisa?

- Não.

sexta-feira, 17 de abril de 2015

Ir ao Coração das Pessoas

Persistir na verdade. A verdade para mim é o que é próximo de fazer o que é correto. Há verdades universais que não nos pertencem, muito embora nós a percebamos com a razão, com o pensamento que nosso cérebro constroi magistralmente.

A inteligência, que é o exercício diário de nossos pensamentos relacionando tudo o que for possível para pensarmos cada vez mais e mais inteligentes ficarmos.

Devo admitir. Neste exato momento, sinto-me aliviado. Os últimos dias foram daqueles que nos ajudam a valorizar nossos momentos de paz.

Eu disse dias atrás que muito de nossa paz vem do outro, porque o outro tem este poder de acabar nosso sossego e raramente nos deixar em paz. Sei lá o que acontece. Mas o que acontece é quase isto: poder respirar tão calmamente que o segundos passam a equilaver a horas, tamanho o desprendimento do tempo; tão lentamente respiramos que o tempo congela e sabemos o que é agradecer respirar em paz.

Ontem na sala de aula, ou na quarta-feira, disse que meus personagens, dos meus livros, falam por mim. São vários personagens. Quando escrevo aqui, no blog, nas mídias sociais, há um mix de escritor, professor, pai, irmão, humano, sonhador etc, e o que vale mesmo é quem lê. Da leitura descobre, descortina, revela-se, surge ou desperta de preferência algo bom.

Por este motivo a chave - escrevi no início - é persistir. Persistir na verdade. Contra ela, você somente será caluniado, difamado, desrespeitado e mais nada. Você está na verdade. A verdade tem começo, meio e fim. Somente. Já a mentira...

Adoro poder palestrar a respeito disto. Adoro poder levar um pouco de reflexão às pessoas e aos jovens, sejam em aulas ou palestras ou nos meus textos.

Ontem mesmo, tive mais um simples, mas belo depoimento, fruto de algumas palavras minhas. É coisa pequena mesmo, mas que para a pessoa ajudou a mudar positivamente a vida dela. Ela percebeu que pode fazer uma viagem para o exterior. Algo que não havia até então acreditado. E me agradeceu por isto. Algo relativamente pequeno diante do que o mundo nos oferece.

Quando queremos mudar o mundo externo é óbvio que queremos ter poder, mandar e subjulgar os outros; quando nossas atitudes ajudam a mudar pessoas individualnente, nosso muito interno ter auto-confiança suficiente para saber o que quer e a que caminho ir. Ir ao coração das pessoas. Que elas descubram seu mundo interno e para o expandir.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Clara e a Noite

Era noite ainda.
Clara disse,
Olhar solto,
Era tímida,
Que amar,
Assim de dia,
Sua vida vivida
Muito mais ela a
Prolongaria.

Clara sorriu.
A timidez coloria.
Buscou no chão
A tal solidão
Que sentia.
Clara, timidamente,
Chorou seu sorriso
E gritou no silêncio:
"Sempre amaria!"
Dor passageira.
Uma hora, sim!
Sim, qualquer hora,
Ela, a dor, em lugar,
Em lugar algum
Desvaneceria.

Sua felicidade,
Clara, claro, clarearia.
O dia veria da noite
Sombria. Clara iria.
Era a noite posta
Ao vento posta
Os uivos sons...
Sombrios, noite fria.

"Clara, clareou o dia!"
O dia lhe sorria.
Confusão do amor.
Que amor haveria?
Era a voz da alegria.
Cantou Catão o amor.
"Nosso dia clareou!"
O amor uniu
A solidão de Clara
E de Catão o desespero.
"Volta para mim!"
Não podia, poderia.
E vivem amantes
Feitos ares fugazes
Paixão de dia e noite.
Paixão eterna
De noite e dia.
Eternamente dia.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Solução ou Problema

Toda a aula 11 do Converstion eu extrapolo. Vou além. Por uma causa positiva. Ultrapasso limites. Tematizo livremente. Preso a um tema, claro. Falo sobre o stress e aí eu me liberto de qualquer zona de conforto. Falo basicamente em inglês sobre pessoa negativa e pessoa negativa. Aparentemente tema já desgastado. Mesmo assim eu creio que dependendo de como falamos ou escrevemos ou nos comunicamos, a mensagem se comunica mais amplamente. Não é disto que precisamos? Ampliar os conteúdos?

Stress é pressão em inglês. Estar sobre stress é o mesmo que sobre pressão. Resumindo. Vivemos de "normalidade" e "anormalidade". A pressão entra aí: na anormalidade. E se existe anormalidade, existe um problema; se existe um problema, existe uma pressão sobre nós: quem é positivo: solução; quem é negativo: mais problemas. Dei o exemplo simples da fatura do cartão de crédito e a falta de dinheiro; ou o filho tirando notas baixas na escola. São dois problemas. E agora a reflexão.

Uma pessoa negativa é aquela que foca no problema; uma pessoa positiva é aquela que foca na solução do problema, o que parece coisa simples. Prosaico, aliás. Mas com boas consequências para quem tem consciência positiva.

Você, ou eu, ou qualquer pessoa do seu trabalho pensa positivo ou negativo? Não basta julgar. Neste caso é ser: ou negativo ou positivo. E aí outras reflexões: você é parte da solução ou parte do problema? Ou mais intenso: você é a solução ou o probema?

Refleti também (em inglês) que problema é qualquer desvio de padrão, desvio de normalidade. De modo que todos temos e teremos.

Uma pessoa positiva não é sinônimo de felicidade; um pessoa positiva pode ser séria, mas certamente não é insensível. Toda solução exige sensibilidade. Uma razoável postura simplesmente, porque é consciente. A consciência plena é positiva porque foca na solução.

E como polêmica, levantei a questão na sala de quem é a favor de diminuir a maioridade penal. Não importa a posição de quem agora. A questão (para se pensar positivo) é quando esta lei será a solução. Por mim, esta lei será a solução quando vivermos em uma sociedade consciente do que quer fazer com seus problemas: solucionar ou aumentar, ou seja: viver positiva ou negativamente.

domingo, 5 de abril de 2015

Enxergar com os Olhos da Alma

Enxergar com os olhos da alma. Este foi um tema proposto a mim. E ela depois complementou: aquilo que é sensível, nos toca, emociona.  Lá vai.

O que nos emociona somos nós mesmos através do outro. Pessoalmente sou emotivo. Falo com uma naturalidade sem vaidade, sem orgulho, sem praticamente nada a não ser a minha própria experiência de corpo e vida ao mesmo tempo.

Hoje desfruto de uma liberdade emocional enorme. Minha liberdade é exclusivamente interior. Me permite deixar mais solta minha alma, minha sensibilidade, meu emocional.

O tema foi enxergar com a alma. Aqui a alma são emoções. Nem toda emoção, no entanto, nos arrebata em êxtases. Quem lê este pequeno rascunho de palavras pode estar nas dúvidas existências das mais variadas, sintetizadas no medo, insegurança, incerteza.

Para a alma turvada, enxergar o que não se quer machuca. Mais belo seria iludir-se, escapar, sonhar, devanear-se, ir para as sensações de gozo e prazer em nossos sentidos fantasiosos. Uma transcendência bem superficial que a arte ou o vinho proporciona, por exemplo.

Enxergar com a alma o que é sensível, o que nos toca, o que nos emociona primeiro passa pelas nossas próprias experiências sensoriais. Acredite que dá-se o nome a isto "sensibilidade", "ser sensível" por causa de nossos sentidos. Enxergar seria somente um deles; ouvir outro; degustar e cheira e tocar na pele os demais.

Nossa alma mais do que vê então. Ela degusta; ela cheira, ela ouve e faz da pele de nosso corpo nosso maior e mais importante órgão. Claro que tudo ocorre em nossos neurônios e suas memórias.

Sentir com a alma; degustar com a alma; ouvir com a alma; cheirar com a alma; ver com a alma. Nossa alma parece ser o receptor do que nossa sensibilidade capta.

A emoção em usar cada sentido para nossas próprias emoções (por isto) vem do que o outro faz para nós: qualquer ser humano. Se ele canta ou dança; ou qualquer outra performance hipnotizadora; ou nos trai ou seduz ou nos ignora e humilha. Eu me emociono com o ser humano na sua verdade e amor em ajudar o próximo. Num gesto simples de atravessar a rua ou pegar um papel no chão. Eu me emociono num gesto do outro. Somente um ser vaidoso, egoísta, arrogante, prepotente, cínico e desumano aplude suas próprias lágrimas e ações. Ao menos eu acho.

Precisamos agradecer, portanto, para enxergar com a alma e nos emocionarmos. Agradecer a todos que nos fazem sentir nosso corpo inteiro com emoção e êxtase. As pessoas nos fazem ser. Os outros nos fazem ser. Deles dependemos. Através deles podemos transcender. Sentir. E nossa alma tem existência plena e ampla. Agradecida.

sábado, 4 de abril de 2015

A Arte, a transcendência.

A vida de um escritor aparentemente se confunde com a do homem que está por trás do que escreve. Tenho ultimamente sentido uma estranha dúvida em meus textos. Acho sempre que quem os lê imagina um recado a quem quer que seja que esteja em meu coração. Meu coração, porém, semelhantes àqueles que resolvem materializar esteticamente em arte suas sensações, tenta projetar o que de humano há nele. De humano em mim, em você, em todos.

Vislumbramos modelos de vidas, de aparências, de percepções, de sensações e emoções. Claro que somente depois de sentir amor, angústia, dor, solidão, tristeza, bem como frio, calor, desejo, êxtase e os diversos elementos que criam uma alma viva, depois de sentir boa parte disto, falamos com mais propriedade a respeito, do mesmo modo como falamos com propriedade na relação doença e doente quando um está no outro.

Sou defensor da arte. Fora a relação com Deus para os homens de fé, como eu, a arte é a única sensação que irá transcender viver na Terra. Relembro que viajar é arte; dançar é arte; interpretar é arte; admirar a natureza para os olhos de quem a vê é um tipo de arte. Viver. Sentir. No universo das sensações ir além é ser artista sendo ou não sendo um.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Sofremos quando mal-entendidos

Reparem nestas palavras:

"O que nos entristece verdadeiramente e que nos torna amarga a existência refere-se sempre à relação com nossos semelhantes. Pessoalmente estou convencido de que sofremos quando somos mal-entendidos pelos outros e sentimos com isto aviltados, maltratados, desvalorizados."

Não são palavras minhas. São palavras de um artigo chamado "A Dor do Homem". A dor emocional. Ele não considera a dor em função de mal-funcionamento do cérebro, causando os transtornos congênitos. Não dor física também. Dor emocional que se cria em uma relacionamento. Tirando este parênteses, parece-me perfeito a definição.

Por princípio, a dor, a mágoa, os rancor, o ódio, a solidão, a angústia e sentimentos semelhantes são algo de cunho bem pessoal, porque cada qual sabe a sua profundidade. A psicanálise, porém, pode dar uma outra abordagem, ainda mais no que diz respeito ao sofrimento emocional. O outro, o nosso semelhante, de quem gostamos, porém quem não mais queremos como corpo, tende a nos querer ver sofrer, nos fazer sofrer, nos levar ao sofrimento. Nada psicologicamente impressionante. Assusta um pouco, é verdade. Mesmo assim, o susto é o inacreditável juntamente com o inesperado.

Ser comunicativo traz ao homem enorme vantagem para buscar alívios emocionais. Ser cominucativo e culto surpreende e provoca um pouco o inesperado e o espanto. Ser cominucativo, culto e atencioso leva ao encanto. E ser encantador por um período leva ao amor profundo. Quando surge todos os demais conflitos porque o amor pode ser correspondido, o amor pode ser ao mesmo tempo correspondido e dificilmente realizável, o amor pode ser uma belíssima ilusão. O sofrimento vem neste momento. O fazer sofrer aparece a partir de então.

Entristece-me verdadeiramente a querer gerar a dor gratuita. Creio que querer fazer o outro sofrer, algo do inconsciente da pessoa, causa um alívio momentâneo, mas sem fim. Ou um alívio duradouro se a pessoa realmente for muito fraca e amar o sadismo. Como eu tenho baita consciência disto tudo, meu cuidado com o sentimento das pessoas chega a ser como dar brilho a uma taça de cristal para o champanhe. Não descuido da fragilidade.

Retomando o texto acima, "sofremos quando somos mal-entendidos". Eu acrescento: propositadamente mal-entendidos! Ainda que a pessoa não tenha plena consciência. O sentimento de amor pelo outro, que não mais temos, turva as palavras porque ele espera veneno em tudo. Nunca néctar. Botar dois para conversar quando um quer ver o outro sofrer, vira uma guerra de perdedores e cada vez mais desafetos. É triste. Talvez necessário. Mas é triste. De minha parte, escolho escrever para fazer o processo inverso: compreender e fazer refletir. Sou compreensível e reflexivo. Da vida, nada levamos. Poder deixar bons momentos para quem nos ama de verdade é uma dádiva. Dadivemos!

quinta-feira, 2 de abril de 2015

Doméstica (microconto)

Ela vive o que sente. Por viver tão pouco, sente alguns raios da quentura do sol ao caminho do trabalho. Antes do sol, o chão de terra empoeirada, as pedras pulando um pouco apenas nos seus passos. Os passos arrastados, curtos, pequenos. Sente pouco o som também por isto. Ela vive o que sente. Vive pouco. Sente o cheiro do mato seco. O frio não é tamanho. O pouco pano, no entanto, que encobre seu pouco corpo esfria o gelado do pouco corpo e muito osso. Ela vive o que sente. Vive pouco. O tempo sempre o mesmo que mede o início do andar ao término do chegar. Chega cedo. Desperta cedo. Leva a frente de si um carrinho tão judiado quanto o seu sapato. No carrinho um pequeno corpo de pouco tempo que vive sem sentir o que ela sente. Nem o que ela sentiu. Sua fala, ela não sente. Não a do corpo dentro do carrinho. Ele grunhe mais do que ela. Sua fala pertence à obediência de aceitar as ordens o dia inteiro. Ela vive o que sente. Sente logo cedo o preparo do café para os pais e os filhos; sente a mesa posta; sente as pernas mais frenéticas entre a cozinha e a sala; sente a água nas frutas, as frutas na mesa, e a mesa farta com a fartura de quem vive o que sente. Depois do café, sente repentinamente o apartamento vazio de pessoas. A pia cheia, a lavadora cheia e as camas cheias e o dia inteiro pouco para tão pouca vida. O almoço no fogo, o fogo na panela, a panela na pia. Ao meio do dia a casa parcialmente cheia. Os filhos chegam. E comem. E sorriem. E ligam a TV. E descansam mais tarde. E os pai chegam. A janta pronta. O vinho temperado na adega. A taça limpa. O queijo cortado. Antepastos e pão italiano. A vida limpa para quem vive o que sente. A paz da ordem entregue aos filhos e aos pais que logo se banham com a toalha perfumada esperando o corpo macio e corado de todos. Então ela vai em silêncio. Sem sol, um pouco do frescor da noite, ela volta, no pano que a encobre para não mostrar nada de sua nudez; no carrinho o corpo que silenciosamente sentiu o dia todo entre leite e papinha; o caminhar vagaroso no início sem terra, depois a poeira. O corpo sentindo o tempo de chegar à sua casa, ao seu lar, à falta de luz que nem questão de televisão faz. O fogão esquenta um pouco de água. O pó saiu do corpo do corpo no carrinho. O mesmo pano torcido, enxaguado, limpa seu pouco corpo. Quatro luzes de vela. Tinha o luxo de comer das sobras ao longo do dia e tarde da noite. E come. E comem. Quatro sopros depois, sente a escuridão da casa dentro de um quarto. Deitada, em silêncio, olha para o nada. Ouve uns grunhidos do corpo pequeno ao seu lado. Não pragueja nada e agradece. Melhor do que tudo. Dorme. Numa paz pouco sentida pela humanidade. Dorme bem. Sonha com a terra da rua e só. Desperta feliz. Em silêncio. Poucas horas tem sua noite. Ela vive o que sente. Não fala com ninguém e nem para ninguém. Ela é agradecida. Sua felicidade vem do que ela sente. Ela vive o que sente.

Sacridade do Corpo

Reli pela décima vez um texto maravilhoso chamado "Sacralidade do Corpo". Desta vez, no domingo, eu o reli com uma amiga. Eu lia, discutia, explicava, propunha reflexão e exemplos. Foi muito gostoso. Do jeito que acho que sempre deve ser. A essência deste artigo é quando o corpo vira fantasma para justamente aquela pessoa que sempre nos amou. Não o nosso corpo como fantasma, mas quando não reconhecemos naquele outro corpo a sua essência, deixamos de amar aquela pessoa e começamos a não reparar mais naquela existência tão outrora importante para nós e ela virando fantasma, sem mais nossos toques que a descobriam. São belas oito páginas transcendentais para quem não ama mais e para quem não mais é amado. Alivia para ambas as partes muito dos descorfortos emocionais. Afinal, não dá para sempre se sentir culpado. Nem de um lado, nem do outro.

Nosso Tempo

Conversando com uma querida amiga nos seus 36 anos, e eu nos meus 41, disse a ela algo como - a partir de um certo momento - devemos encarar a vida como um tempo e não mais como anos, ou mais precisamente, com a idade que martela um prego para dentro de nossa cabeça, insinuando aquilo que na verdade não somos: idade.

Todos os anos, inevitavelmente, baterão em nossa porta emocional amigos e parentes congratulando-nos pelo ciclo que remete aos ciclos solares sobre a Terra. Chama-se a isto ano. Isto é hábito, tradição, até ritualismo.

Tem suas razões de ser, claro. Mas, como disse, melhor mesmo deixar a cara limpa com o tempo contínuo (temos tempo) do que focar nos anos racionais das leis newtonianas gravitacionais do sol sobre nós. Sendo o ano um ciclo do sol sobre a Terra para a astro-física, o que resta-nos então? O tempo contínuo.

É comum à juventude fragmentar-se. Estimulada pelos pais desde o primeiro mês de vida. As idades como 10, 15, 18 anos são basilares. Cada momento com sua força psicológica e eventual simbolismo social e pessoal. O mundo do tempo presente é infinito aos nossos jovens como foi para nós. Mesmo porque, de um modo geral, na idade da juventude, que obrigação eles, os jovens, tem senão o da descoberta?

O novo seduz facilmente como pouca coisa ao longo de nossas vidas. O novo é sempre ser. Um eterno ser. Jamais um estar. Sou feliz traduz uma perenidade; estar feliz, uma transitoriedade.

Não é por outro motivo, portanto, que pensar em tempo de vida seja mais adequado do que pensar em anos de vida. Somos uma vida e não estamos velhos, ou com mais idade etc:

"Qual a sua idade?", perguntam-me.

"Estou com 41.", respondo, quando poderia me permitir falar: sou um tempo contínuo...

Porém, compromissos como IPVA, Imposto de Renda, Natal, Ano Novo, Férias etc., nos condicionam a viver anualmente. A estar preso aos ciclos anuais. Aí vem o "estou velho", "estou com idade", "estou com 40, 41, 42, 43...". E não um "sou um tempo contínuo, e neste tempo contínuo, sei muito bem o que pretendo, quero, posso ser ou não posso mais." Ser um tempo ajuda sobremaneira. Muito melhor do que estar com idade.

A ideia de recomeçar deve ser uma virtude por uma razão simples (eu disse há pouco): nada seduz tanto nossa mente do que o novo, se acreditarmos que somose não estamos. Recomeçar estando com x idade vai angustiar. Mas recomeçar sendo um tempo, sentindo o universo desafiador, reconfortante, cheio de energia potencial é sublime. Somos um temos. Até o momento em que estejamos todos, inevitavelmente... preocupados em pagar todos os impostos anuais. Inexoravelmente. Somos e não estamos para a vida...

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Neurônios-Espelho: Perdoar as Fraquezas

Imagine que dentro de nosso cérebro temos algumas áreas que são as responsáveis por aprender. Aprender virtual e culturalmente. Parece óbvio. Evidente mesmo. Dá-se, porém, o nome "neurônio-espelho" aos responsáveis por essa coisa simplória de aprender copiando. Isto é fascinantemente revelador.

O que diferencia o ser humano de todos os demais seres vivos neste planeta é a enorme quantidade de neurônios-espelho.

Eles existem em nossos cérebros e entram em atividade virtuais a todo momento. Um exemplo? Cinema. Uma cena em que um homem tomou uma bela cacetada bem na sua parte mais sensível: o saco! Não foi em homem algum na platéia. No entanto, virtualmente a "dor" foi estimulada e reprimida ao mesmo tempo, como se sentíssemos, mas sem sentir: esta é a função destes neurônios em nosso cérebro. Entrar na experiência do outro e aprender.

Viver com bastante estímulo. Por que viver com muito estímulo é importante então? A resposta vem do Ramachandran, neurocientista revolucionário:

"Os neurônios-espelho desempenham mais um papel importante na singularidade da condição humana: permitem-nos imitar."

Não tivéssemos a capacidade de imitar desde os primeiros meses, seríamos 100% instintos e assimilação cognitiva pequenina. Agindo mais com instinto, não teríamos Cultura. Sem Cultura, não desenvolveríamos por exemplo a arte. Sem arte, sem sentimentos, já que não teríamos memórias, uma vez que memórias são emoções arquivados.

Esta é chave para nos deixar sempre abertos para o mundo e para o outro e com o mundo: neurônios-espelhos.

Não reprimir e excitar a função destes neurônios em nossa cabeça devem fazer parte de nossos dias. Os anos e a repressão social parecem inibir essa aprendizagem, que temos. Porém, ela é inata e nos faz ser o que somos: seres de cultural. Ser estimulado a reconhecer a cópia emocional será o passo mais importante da educação humana.

Ter consciência que aprender com a experiência do outro (até para entendê-la melhor) pode fazer parte da vida de todos: claro que nem todos vão, por exemplo, entendê-lo.

Por isto existe o perdão: saber que o outro é mais fraco - usa menos os neurônios-espelho que você. Em resumo:

"... a consciência do outro e a consciência de si desenvolveram-se conjuntamente, levando à reciprocidade 'eu-você' que caracteriza o ser humano."

Desenvolver relações através do ponto de vista do outro. Acho que este é o caminho da liberdade, esta é a chave que abrirá maior entendimento entre as pessoas.