- E aí, vamos lá?
- Agora não dá! Nem vai, mano! A história tá estranha.
- Mesmo? Passa outra então.
- É o seguinte. Vitelo trouxe a parada ontem, lá pelas sete da noite. Muita gente nem sabia. Peguei a fita naquelas que nem dá pra imaginar. Sorte! E passei na manha. Bico calado. Fiz de Zé. Me olharam atravessado. Uns, né? Sempre tem uns que dá dó depois. Jão de tudo.
- Mas, aí, que pega então? Não é só colar e um abraço?
- Na manha, Fio. Já falei. Agora não dá. E outra parada. Dizem ai que Marquinho Fiúza não passa dessa noite. Uma treta que não colou ainda direito. Dizem que comeu aí a mina do Azulão. Boato é foda. Tá pedido até umas horas. Nem cola também por isso.
- É. Faz assim. Agora é três horas. Saio às seis da tarde do Betão. A gente vai limpo, sem nada. Cola lá para jogar bola. Ideia vai; idéeia vem. E a gente dá a ideia de uma vez direto pro patrão. Sexta-feira. Vai livrar a cara, Tomé. Cinco conto.
- Faz assim. Depois te dou a idéia de como chegar na boa, sem alarde, direto. Mas limpo não dá. É arriscado. Esse pessoal pega e de uma vez.
- Faz assim. Me liga, Tomé.
- Falou, Fio. Fica ligeiro.
- Falou.
- Falou.
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- E aí? Nada?
- Pilantragem.
- Que foi? Nada? Não zerou nada?
- Não dá pra crer. Nem vai acreditar que Tomé quer me levar pra grupo. Deu umas idéias atravessadas. Quase tirei e zerei o cara. Pilantra! Me segurei até umas horas, louco para acertar bem na testa. Veio desconversando. Disse lá uns papos que nem ele botou fé. Fiz de Jão, mas é o seguinte, Britão, hoje mesmo vamos colar lá, só a gente e pegar o barato. Tomé disse que Marquinho Fiúza tá pedido. Um tal de Azulão. Liga ele?
- Nunca vi nem ouvi.
-Levei uma idéia com Marquinho hoje mesmo, de manhã, numa fita que a gente tem junto e ele ia me ligar qualquer parada estranha com ele. Vamos lá. Vou dar um pulo no Laguinho para falar pro Betão que vou chegar de madrugada. Vai ser foda explicar, mas a treta é essa. Fica com meu carro e eu vou com sua moto.
- Falou, Fio. Põe aí uns vinte contos pelo menos para eu dar um rolê de noite.
- Beleza. Se for pra casa, liga pra Cidinha que chego tarde, só de madrugada. E pede pra mãe não falar nada de mim no telefone e nem pra Cidinha. Essa gravidez tá naquelas. Não quis tirar agora ela que segura a bronca.
- Falou, Fio.
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- E aí, Robertinho.
- Fala, Tomé. Cadê o Fio? Não vinha com você pra fita do Betão? Essa noite ele espera uns bataros aí. Sexta-feira. A coisa da chovendo montão.
- É. Só que é o seguinte. O Fio deu mancada. Disse que querem zerar o Marquinho Fiúza. Sei não. Parece que tá querendo armar pro mano lá. Ligou ele hoje?
- O Fio?
- Não. O Marquinho. Preciso ligar pra ele essa parada. Cê viu ele por aí?
- Nem, mano. Mas isso é foda. Que o Marquinho fez pro Fio dar umas dessas?
- O de sempre. Tá falando das paradas do pó. Querendo fornecer pro Betão. Não disse nada. Falou que não tem nada com isso. É o seguinte, Robertinho, fala pro seu pai não cair na do Fio não, mano. É bem capaz de ele colar agora mesmo no ouvido de seu pai e dizer que vai atrasar a parada. Eu falei pra ele ir lá comigo, mas desconversou. Faz assim, vou ver se acho o Marquinho e ligar pra ele pra ficar ligeiro. Caralho. Sexta-feira, mó dia dá hora e a gente aqui. Era pra eu já tá viajando hoje pro sítio do Guito. Vai rolar um churrasco lá nesse fim de semana.
- É. Faz assim, Tomé. Dá a ideia você mesmo pro meu pai. Essa parada não me envolvo senão ele me enche o saco.
- Falou, Robertinho. Vou dar um pulo lá agora.
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- Que isso, Tomé. Ce tá de brincadeira. Quem te deu essa ideia?
- O Robertinho falou pro Fio que me disse. Mas é o seguinte. Vou ligar pro Betão que treta é essa com você. Você saiu com a ex-mina do cara, Marquinho? Lembra aquela vez? Rolou mó fuzuê.
- Faz tempo essa parada e nem foi assim. Mas é o seguinte. Vou lá ligar pro Betão que parada é essa. Do nada, mano. Agora que tô saindo da boa, depois de pegar uma cadeia. Vou lá dar a ideia pro Betão.
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- Sério? Que porra! Quando foi?
- Faz meia hora, Betão. Passaram o cara, três tiros nas costas, bem lá na Vila Gomes.
- Que merda, Tomé. Não faz nem um mês que o cara estava na rua. Se bem que ele tinha um monte de treta e já vinha jurado faz tempo. Mas e aí, já ligou pro irmão dele? Ele saiu daqui faz meia hora com o Fio. E preciso daquela parada hoje, Tomé. Cola lá e tira na maior. Fala que dou um ágio por ele.
- Certo. Mas aí Betão, você falou que o Fio saiu agora com o irmão do Marquinho Fiúza? Hummm. Você não ouviu um boato aí, que o Fio queria passar o Marquinho por causa de umas paradas do pó que você queria?
- Sério, Tomé? Vi o Fio dando uma ideia pro irmão do Marquinho ali no canto. Nem colei. E depois saíram numa correria os dois, na moto do irmão do Fio. E agora você me liga essa ideia da morte do Marquinho e que o Fio queria passar ele. Se for isso, vai ficar feia a coisa. Mas essa parada não é minha. Vai lá e pega a parada pra mim. Agora é cinco da tarde. Traz lá pelas oito horas. O Fio me ligou que podia embaçar hoje, chegar pela madrugada. Falei pra ele não dar uma dessas. Tem que chegar aqui antes das oito. É você que vai lá pegar o barato com o Fio, não é?
- É.
- Então. Até mais.
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- Caralho, Tomé. Passaram o Marquinho essa tarde, mano.
- É. Não falei. E o pior é que o irmão dele tá pensando que foi você que mandou fazer essa parada.
- Tá maluco, Tomé. Se atravessar de novo nessas ideias te furo.
- Pera aí. Solta minha gola, Fio. Que é isso. Só tô te ligando o que o Betão me ligou. Disse que você saiu com o irmão do Marquinho e que você mandou apagar ele.
- Que porra é essa que você tá falando, Tomé? Falei com o Betão quase agora e ele não me ligou nada. Disse apenas que passaram o Marquinho e que o irmão dele estava me procurando. Só que eu tava atrás do Marquinho com o irmão e nada.
- É o seguinte, Fio. Me solta e vamos lá pegar o bagulho pro Betão. A gente cola lá na quadra e deixa essa parada pra depois. Ei, olha o irmão do Marquinho vindo com o Coquinho de moto.
- Que isso Coquinho, abaixa essa arma, mano!
- Filha da puta! Zerou meu primo agora vai morrer. Vai pra lá Tomé.
- Que é isso Coquinho. Para mano...
- Já era. Toma filha da puta! Toma.
- Vamos, Coquinho! Vamos. Sobe na moto.
- Aê, Tomé. Na moral, hein, mano. Nem me viu.
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- Betão, aqui tá a parada. Três quilos. Você ficou sabendo do Fio?
- Fio, Marquinho, Coquinho, Vitelo, o irmão do Fio, o irmão do Marquinho. Que porra aconteceu, Tomé? Passaram todo mundo hoje. Que merda!
- Só que é o seguinte. Vão passar seu filho também, Betão, e tão falando por aqui que você que mandou passar todo mundo para ficar com todos os pontos. Quem me ligou essa idéia foi o finado Vitelo que distribui pra todo mundo.
- É o seguinte, Tomé. Se alguém me encher o saco nem vou esperar e zero de vez. E é o seguinte, deixa o pó aí. Toma o dinheiro. Quando ver o Robertinho pede pra ele não vir aqui não. Fala pra ele dar um tempo longe daqui. Fala pra ele descer pro litoral e ficar lá um tempo. Dá esse grana pra ele.
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- Não brinca, Tomé. Brinca não, cara.
- To falando Betinho. Apagaram seu pai com três tiros na cabeça.
- Quem foi, mano?
- A polícia. Pegaram ele sem dó.
- Não fode, Tomé.
- É o seguinte, Betinho. Toma esse dinheiro. Deve ter uns cinco mil. Sai fora. Some por um tempo até ficar calmo a parada aqui. Muita morte pra um dia. Some, mano, antes que até você vai pra grupo.
- Falou, Tomé.
- Falou, Betinho.
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- E aí, patrão.
- É o seguinte, Tomé. Você vai passar agora o barato pra todo mundo. Fica com você daqui pra frente e lembra, sem dó nem piedade. Jamais dá um pingo de abertura. Deveu, não pagou, zera logo. Vai servir de exemplo. Vamos começar do zero depois do que aconteceu hoje. Puta que pariu! Nunca vi nada parecido.
- Falou patrão. Deixa comigo.