quarta-feira, 3 de novembro de 2021

Muitas pessoas precisam da aprovação alheia, e por isso berram com megafone suas realizações, conquistas, falicidades, amores e virtudes - escondendo tudo o que as diminui. Porém, não existe neutralidade nas nossas ações, porque não existe vida humana sem precisar do olhar alheio para sentir a realidade das emoções ancoradas em nós. Apenas sabemos nossas emoções através do outro. Vergonha, ódio, amor e empatia são simplesmente projeções dos outros sobre nossos julgamentos. Não sentimos mais vergonha do nu ao lado de quem nos acostumamos a estar nus. A pessoa que um dia amamos pode ser a mesma que um dia odiaremos. Nossas emoções são nossas, mas a causa delas, a origem delas deve estar no outro - isso é estrutura neural congênita pura. Nesse sentido, a autoafirmação ou a necessidade da afirmação alheia, ou o autorreconhecimento ou o reconhecimento alheio destoam um pouco dessa lógica. Se não precisamos do outro para nos sentir bem com nossas conquistas, e se não precisamos da aprovação do outro para que estejemos realizados, então temos autoconsciência de um valor íntimo, que vale apenas a nós mesmos. Pessoas altamente autoconscientes de seus limites diminuem a presença do outro nelas. Há pessoas, inclusive, que procuram confundir os demais, por medo de olho-gordo, inveja ou superstição. São pessoas plenamente realizadas, mas escolhem a publicidade da parte dificil de suas vidas, como as frustrações, os desamores, os fracassos, os limites, ocultando assim o que poderia ser o alvo do que consideram o mau-olhado. Quem precisa do outro, ao contrário, quem precisa da aprovação e afirmação do outro, deseja, inclusive, causar inveja, sem a qual o que tem, não tem muito sentido. Uma amiga propôs a reflexão "Será que consigo enxergar felicidade em mim?". A resposta está em primeiro saber quanto de autoconsciência temos das percepções de nossas emoções (ainda que todas sejam projeções das outras pessoas), sem ainda depender de despertar no outro emoções ou sentimentos que nos interessam. Para ilustrar. Podemos compartilhar momentos ou podemos ostentar momentos. Compartilhar momentos tem algo quase inspiracional, motivador; ostentar momentos, é a síndrome do Kiko-Chaves, tipo, "olha o que eu tenho e que você não tem". Quem nunca compartilha ou ostenta, pode ir bem na sua vida emocional, obrigado, consigo mesmo, mas pode também estar simplesmente péssimo, quase desconfigurado, com seu emocional destruído. Então, voltando à pergunta "será que consigo enxergar felicidade em mim", a resposta pode ser encontrada pensando em quanto dos outros está em cada um de nós, quanto precisamos da aprovação alheia, quanto que os outros precisam saber de nós para nos sentirmos felizes. Podemos nos dar o direito de aparecer, compartilhar, ostentar pontualmente, estrategicamente, assim como muitas marcas se associam a algumas personalidades e não a outras. Sei que a reflexão parece longa, mas a autoconsciência é um longo caminho. Uma breve sentença do tipo "conhece a ti mesmo" é autoajuda motivacional. Já uma reflexão mais longa é o início do primeiro passo da autoconsciência. Será que eu consigo enxergar felicidade em mim? Vamos propor uma outra pergunta. "Quantas pessoas estão em meus sentinentos e quem eu quero que saiba de minha vida?" Se for um número bem seletivo de pessoas, como filhos, pais, pouquíssimos amigos, então a felicidade parece mais próxima, porque ela é pontual, com endereço certo, não fragmentada, nem diluída. Mesmo porque, felicidade é apenas uma percepção, assim como os demais sentimentos.

- flavio notaroberto -

Nenhum comentário:

Postar um comentário